"Ao Verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas"
Dedicatoria do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas
Quando decidimos fazer a transposição da obra Memórias Póstumas de Brás Cubas para a cena teatral, pensamos ser interessante conceber um espetáculo que fizesse juz à amplitude estética do livro e a seu caráter extremamente inovador. A proposta, portanto, era salientar o que ainda hoje exala de modernidade na obra de Machado de Assis e fazer um espetáculo para que as novas gerações pudessem apreciar esse grande escritor em toda a sua ousadia.
Tendo em vista que o estilo machadiano é sua força maior, entendemos que o texto deveria ser usado sem retoques, com apenas algumas adaptações para a linguagem teatral e enxugando-se o número de capítulos. Um dos tradutores de Machado para a língua inglesa, Rabassa, salienta a beleza do seu estilo: “Traduzir Machado ‘foi muito divertido, seu português é fluente , fluido e clássico, provavelmente, a melhor prosa em português já feita. Mas ele tinha uma sensibilidade que estava à frente de seu tempo, e talvez até mesmo à frente do nosso tempo; cético e não um idealista". Acreditamos que a obra possui sua própria força e impacto, e desta forma, nos deixamos levar pela sua essência, criando um espetáculo dinâmico e moderno que transitasse entre diferentes propostas de interpretação.
Convém esclarecer ainda que, objetivando criar uma linguagem lúdica e divertida, resolvemos montar a peça com apenas duas atrizes que se revezam com agilidade e desenvoltura durante toda a montagem, passando por todos os personagens e dando a cada um deles o seu toque de originalidade.
A história é contada por meio de diferentes estilos – do realismo ao melodrama – o que traz um dinamismo para a cena que a todo o instante brinda o público com novos estímulos. Dessa forma, não só evitamos a dispersão do mesmo, mas também fazemos jus ao polêmico e inovador caráter do romance.
Resolvemos ainda inserir na proposta da montagem o teatro de animação como recurso para a realização da narrativa. Dessa maneira, os bonecos, de diversos tamanhos, dão a graça e o tom de realismo mágico presente na obra, aumentando o caráter dinâmico e criativo da montagem. Nessa proposta um personagem pode, ao mesmo tempo, aparecer como boneco e também ser interpretado pelas atrizes, o que causa uma graça e um estranhamento bem ao sabor da sátira.
Nosso intuito é, portanto, alcançar, mesmo que na “ponta dos pés”, o gênio de Machado de Assis e provar que um grande autor é atemporal e sempre aberto para diferentes propostas, podendo ser apreciado em diferentes veículos sem perder sua originalidade e estilo.
FICHA TÉCNICA
Texto: Machado de Assis
Direção e Adaptação : Christiane Lopes e Renata Mazzei
Assistência de direção: Roberto Matsubara
Produção: Das Duas Cia. de Teatro
Elenco: Christiane Lopes e Renata Mazzei
Figurino: Christiane Lopes
Cenografia e Cenotecnica: Fábio Gerônimo
Orientação de manipulação, bonecos e objetos: Fábio Pinheiro
Designer Gráfico: Iberê Borges
Iluminação: Denilson Marques
Trabalho Corporal: Renata Mazzei
Fotografia: Cabelo Duro Produções
Trilha Sonora: Das Duas Cia de Teatro e Roberto Matsubara
Projeto Pedagógico: Das Duas Cia de Teatro e Silvia de Paula
"Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo (...) Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na minha bela chácara de Catumbi."
(Trecho de Memórias Póstumas de Brás Cubas)
Sobre a concepção cênica de Memórias Póstumas de Brás Cubas